O vício oculto está previsto nos arts. 18, § 1º e 26 §§ 1º e 3º do Código de Defesa do Consumidor (CDC) que dispõem:
“Art. 18. Os fornecedores de produtos de consumo duráveis ou não duráveis respondem solidariamente pelos vícios de qualidade ou quantidade que os tornem impróprios ou inadequados ao consumo a que se destinam ou lhes diminuam o valor, assim como por aqueles decorrentes da disparidade, com as indicações constantes do recipiente, da embalagem, rotulagem ou mensagem publicitária, respeitadas as variações decorrentes de sua natureza, podendo o consumidor exigir a substituição das partes viciadas.
I- a substituição do produto por outro da mesma espécie, em perfeitas condições de uso;
II- a restituição imediata da quantia paga, monetariamente atualizada, sem prejuízo de eventuais perdas e danos;
III- o abatimento proporcional do preço.
“Art. 26. O direito de reclamar pelos vícios aparentes ou de fácil constatação caduca em:
\I – trinta dias, tratando de fornecimento de serviço e de produtos não duráveis:
….
1º. Inicia-se a contagem do prazo decadencial a partir da entrega efetiva do produto ou do término da execução dos serviços;
…
3º. Tratando-se de vício oculto, o prazo decadencial inicia-se no momento em que ficar evidenciado o defeito.”
Diga-se de passagem, apenas para constar que o Código Civil Brasileiro também dispõe sobre o vício oculto. Vejamos:
“Art. 441. A coisa recebida em virtude de contrato comutativo pode ser enjeitada por vícios ou defeitos ocultos que a torna imprópria ao uso a que é destinada, ou lhe diminuam o valor.
Art. 445. …
1º. Quando o vício, por sua natureza, só puder ser conhecido mais tarde, o prazo contar-se-á do momento em que dele tiver ciência, até o prazo máximo de cento e oitenta dias, em se tratando, de bens móveis; e de um ano, para os imóveis.”
Entrementes, o presente trabalho se norteará pelo quanto dispõe o Código de Defesa do Consumidor, pela sua efetividade e celeridade na solução dos conflitos.
Assim, quando o produto não atinge o fim a que se destina, tem vícios ou defeitos e avarias decorrentes de sua fabricação.
Tais vícios podem ser aparentes, os que o consumidor logo constata na utilização do produto ou ocultos, aqueles que só se manifestam depois de certo tempo de uso, de difícil constatação pelo consumidor, levando-se em conta, é claro, os fatores como o tempo de uso ou o mau uso que venha antecipar o surgimento do vício oculto.
Geralmente, em se tratando de vícios aparentes, os fabricantes são mais precisos nas informações de troca e assistência dos produtos. Erroneamente, esclarecem que em se tratando de vício oculto, este estará acobertado apenas durante a vigência do contrato de garantia. Os vícios ocultos são previstos em lei, daí, decorre como uma garantia legal. O consumidor tem direito, da mesma forma quanto aos vícios aparentes, de receber outro produto da mesma espécie, a restituição da quantia paga, o abatimento do preço, a substituição das partes viciadas e, se for o caso, a indenização por perdas e danos materiais e moral.
Pelo CDC, quando nos deparamos com vício aparente, o prazo para reclamar é de 30 dias para produtos não duráveis e 90 dias para produtos duráveis, contados a partir da entrega efetiva do produto ao consumidor.
Em se tratando de vícios ocultos, os prazos para reclamação são os mesmos dos acima relacionados, porém são contados a partir da constatação do vício detectado pelo consumidor.
Jurisprudência:
“Código de defesa do consumidor. Compra de veículo novo com defeito de fábrica. Responsabilidade do fabricante.
1.Comprado veículo novo com defeito de fábrica, é responsabilidade do fabricante entregar outro do mesmo modelo, a teor do art. 18, § 1º, do Código de Defesa do Consumidor.
Recurso especial conhecido e provido.”
Ainda, pelo art. 18 do citado Código o consumidor pode reclamar tanto junto ao fabricante quanto à loja onde comprou a mercadoria, o que for mais conveniente ao consumidor.
Aqui abrimos um parêntese. Nem sempre a loja que vendeu o produto, um veículo, por exemplo, pode ser responsabilizada. Os fatos devem ser muito bem analisados e o elemento culpa, necessariamente, precisa estar muito bem caracterizado. Se o defeito é oculto, como é que a concessionária pode descobri-lo ao vender o veículo? Para nós, em se tratando de vício oculto a concessionária não responde e, se condenada for por esse motivo, tem direito de regresso contra o fabricante. O CDC criou uma responsabilidade solidária em caráter abstrato que, à toda evidência, não pode ser interpretada literalmente e aplicada com total abstração dos fatos ocorridos e envolvidos.
Com muita propriedade Irineu Strenger, comentando o art. 18 do CDC, escreveu:
“Essa absurdidade está na lei. Não poderá haver imputação a não ser com a comprovação de culpa do agente, e somente a partir dos nexos causais apurados é que se poderá considerar a responsabilidade solidária, por ser inaplicável, nessas circunstâncias, a chamada culpa objetiva.”
Trazemos aqui um julgado muito interessante à respeito:
“COMPRA E VENDA DE VEÍCULO-Vício de qualidade – Art.18 do Código de Defesa do Consumidor – A solidariedade do revendedor não se sujeita à responsabilidade objetiva, mas depende de prova de culpa – Pelo vício de qualidade responde o fabricante, que deverá substituir o bem por outro, desde que o defeito não seja sanado em trinta dias. Ação procedente contra a montadora e improcedente contra o revendedor – Apelo deste provido integralmente – Provimento parcial do apelo do fabricante, para reduzir a verba honorária. (Apelação nº 273.147.1/1-00- São Paulo, Releltor Des. Alexandre Germano, Câmara de Férias/Jan. 97).
Recentemente, tivemos semelhante problema com veículo de nossa propriedade, com três anos de uso e 16.000 km de quilometragem. Constatou-se um defeito no alternador. É um defeito oculto e não aparente. Não há como detectar tal defeito na compra do veículo.
Fora do prazo de garantia, não nos restou outra alternativa senão a de reclamar junto ao fabricante, por tratar-se de vício oculto previsto nos arts. 18, 26, §1º e 3º do Código de Defesa do Consumidor. Com esta base legal o fabricante foi devidamente notificado para restituir a quantia gasta para aquisição da peça e a mão-de-obra utilizada, sob pena de medidas judiciais cabíveis e postagem em redes sociais. O fabricante fez o pagamento imediato do valor reclamado.
Assim, se o problema apresentado pelo produto decorre de vício oculto, o consumidor pode e deve reclamar, exigindo do fornecedor que sane o vício sem qualquer custo adicional ao consumidor. O consumidor lesado deve denunciar ao Procon, ao “Reclame Aqui” se não for imediatamente atendido.
Precisamos parar com nossas atitudes de comodismo. Dá trabalho para reclamar? Sim, dá. Mas, a nossa permissividade, a nossa passividade e a nossa inércia levaram, em grande parte, o país à bancarrota. Os poderes por nós constituídos praticam atos de desmandos, de mau caratismo, atos desprovidos de qualquer valor ético e nós nos quedamos calados e inertes!
SP, 25-6-18.
Felicia Harada
Advogada sócio da Harada Advogados Associados. Especialista em Direito de Família. Juíza arbitral pela Câmara de Arbitragem do Mercosul. Autora da obra Coletânea de artigos de direito civil. São Paulo: Rideel, 2011. Ex Inspetora Fiscal da Prefeitura do Município de São Paulo.
Fonte: Haradaadvogados.com.br/
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